Lacy e o núcleo familiar da Folia Sete estrelas do Rosário de Maria |
Filha de Dona Maria Ana, matriarca da Folia Sete Estrelas do Rosário de
Maria. Desde criança acompanho todas as fases da jornada de nossa bandeira,
desde a costura das fardas, ensaios e preparação da alimentação dos convidados
das nossas festas de arremate. Com o falecimento de nossa mãe em outubro de 2010,
meu irmão Sidnei assumiu a folia, com muita dificuldade, por conta de seu
trabalho que o fazia viajar de caminhão e ficar muito tempo fora de casa. Nesse ano de 2024, após longas conversas sobre
o risco de nossa folia parar suas atividades, resolvi assumir definitivamente a
bandeira com minha filha Elizangela, que vai ocupar minha função de
contramestre.
Ano de fundação da Folia: 1867
Número de componentes: 38
Endereço da sede da Folia: Rua Otacílio Tavares, 86 - Chatuba, Mesquita-RJ
Lacy com sua mãe, D. Mariana |
É a partir relatos de Dona Mariana do município que se tem informações sobre
a primeira saída da “Sete Estrelas”, em Monte Verde, distrito de Camanducaia,
município de pouco mais de quatro mil habitantes, em Minas Gerais. Segundo ela,
Seu avô Domingos Ramos deu início à jornada que, por sua vez, passou a bandeira
para seu filho Antonio Jacinto que, por conseguinte, também passa a seu
primogênito Antonio Jacinto Filho. Pelo fato de seu filho ser menor de idade e
suas condições precárias de saúde, Jacinto Filho passa a bandeira para sua irmã
Maria Ana. Após passar por municípios fluminenses como Itaperuna, Cambucí, Dona
Mariana vem pra Baixada Fluminense, primeiro em Duque de Caxias e por fim, se
instala no bairro da Chatuba em Mesquita, onde criou seus filhos e onde
nasceram seus netos e bisnetos, todos envolvidos diretamente com a folia de
Reis.
As mulheres sofrem constantemente com o machismo arraigada em muitas de nossas tradições populares. Ainda
que seja a mulher quem sustenta com sua sabedoria e práticas a base de nossa
cultura popular. É inegável que a sociedade urbana e capitalista mantenha suas
estruturas, onde que é o homem branco hetero quem impõe seu modo de vida,
sobretudo por ser esse o perfil de quem domina os meios de produção e acumula
riqueza.
Mesmo
entre grupos populares e tradicionais, muitas vezes espera-se que as mulheres
assumam papéis tradicionais, como cuidar da família, da comida ou mesmo educar
crianças, o que pode limitar suas oportunidades de liderança e participação em
atividades culturais. Sabemos que mulheres de diferentes raças, etnias e
classes sociais enfrentam desafios adicionais. No entanto, mulheres negras e
periféricas podem enfrentar tanto racismo quanto sexismo de forma amplificada,
o que complica ainda mais sua posição em grupos culturais. A violência, tanto
física quanto psicológica, é outro
obstáculo significativo. Mulheres em posições de liderança podem ser alvo de
assédio e violência, o que pode desencorajá-las a continuar em suas funções. A
sub-representação de mulheres em posições de poder e decisão em grupos
culturais pode perpetuar a desigualdade e limitar a diversidade de perspectivas
e experiências.
Reafirmar
a capacidade intelectual das mulheres é papel fundamental do homem que se diz
comprometido com uma sociedade mais justa, exatamente porque a injustiça é algo
comum entre grupos que não disputam a chamada economia da cultura, que se
estabelece inclusive como modelo de gestão, o que relega a segundo plano as
manifestações populares que surgem da base da sociedade, sobretudo no que se
refere à camada menos favorecida economicamente. Assim, fortalecer a imagem da
mulher líder em grupos de cultura popular e tradicional com as foias de reis, torna-se
uma missão, considerando que novas gerações de líderes surgem naturalmente também
nesses grupos. O lugar que Lacy ocupa hoje é então um espaço não apenas de
liderança mas também didático e educativo por natureza.
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*Ivan Machado é historiador, produtor artístico e presidente do Centro de cultura Popular da Baixada Fluminense
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